Os conjuntos que o executam são chamados de Regionais e os músicos, compositores ou instrumentistas, são chamados de Chorões. Apesar do nome, o gênero tem, em geral, um ritmo agitado e alegre, caracterizado pelo virtuosismo e improviso dos participantes. O choro representa a formação instrumental mais tipicamente brasileira e o agrupamento musical mais antigo dentro da música popular brasileira.
O regional de choro é tradicionalmente formado por um ou mais instrumentos de solo (flauta, bandolim, clarinete etc.) e pelo cavaquinho, violões e pandeiro no acompanhamento. O cavaquinho executa ritmo e harmonia, um ou mais violões de 6 cordas (juntamente com o violão de 7 cordas) executam a harmonia e as variações/modulações, o violão de 7 cordas atua como baixo e o pandeiro faz a marcação de ritmo. O cavaquinho, apesar de possuir limitações com relação à sua extensão, também é usado como instrumento de solo.
O choro, em sua essência, é um gênero musical puramente instrumental. Nos poucos choros que possuem letra, pode-se dizer que grande parte foi escrita anos após o choro ter sido composto ou mesmo anos após a morte do compositor.
Poderíamos dizer que o choro, historicamente, começa a nascer na cidade do Rio de Janeiro no início do século XIX, com a chegada ao Brasil da família real portuguesa, que fugia da invasão de Napoleão e trazia consigo entre dez e quinze mil europeus [1]. Como conseqüência direta, a cidade do Rio de Janeiro passa por transformações urbanas e culturais sem precedentes. Músicos, novos instrumentos musicais e novos ritmos europeus chegam ao Rio de Janeiro e são imediatamente aceitos pela sociedade. Em pouco tempo, a cidade do Rio de Janeiro passa a ser conhecida, conforme dito pelo poeta Araújo Porto Alegre, como “a cidade dos pianos”.
O choro é o resultado da exposição do músico brasileiro aos estilos musicais europeus, essencialmente à polca (primeiramente apresentada no Rio de Janeiro em 1845), num ambiente musical já fortemente influenciado pelos ritmos africanos, principalmente o Lundu, já presente na cultura brasileira desde o final do século XVIII. Tal como o Ragtime nos Estados Unidos, o choro surge em decorrência das influências dos estilos musicais e ritmos vindos de dois continentes: Europa e África.
A primeira referência ao termo “choro” aparece na década de 1870, quando o flautista Joaquim Antônio da Silva Callado, considerado pioneiro nesse processo de fusão dos estilos e ritmos musicais europeus/africanos, cria um conjunto chamado “Choro Carioca”. O Maestro e Professor Baptista Siqueira [2], um dos biógrafos de Joaquim Callado, esclarece que com o Choro Carioca, ou simplesmente Choro de Callado, “ficou então constituído o mais original agrupamento [musical] reduzido de nosso país. Constava ele, desde sua origem, de um instrumento solista, dois violões e um cavaquinho, onde somente um dos componentes sabia ler a música escrita: todos os demais deviam ser improvisadores do acompanhamento harmônico”.
De onde vem a palavra “Choro”?
A origem da palavra choro é controversa e não existe uma posição definitiva entre os pesquisadores sobre a questão.
Ary Vasconcelos [3] nos apresenta algumas possibilidades:
- O termo pode ter derivado de “xolo”, um tipo de baile que reunia os escravos das fazendas, expressão que, por confusão com o parônimo português, passou a ser conhecida como “xoro” e, finalmente, na cidade, deve ter começado a ser grafada com “ch”. Esta versão é atribuída a Jacques Raimundo.
- A origem do termo talvez se deva à sensação de melancolia transmitida pelas modulações improvisadas de contracanto do violão (também chamadas de “baixarias”). Esta versão é atribuída a José Ramos Tinhorão.
- Outra possibilidade teria sido aventada por Lúcio Rangel, associando choro a melancolia.
Para Ary Vasconcelos a palavra choro deriva de choromeleiros, grupo de músicos que data do período colonial brasileiro: “para o povo, naturalmente, qualquer grupo instrumental deveria ser sempre os choromeleiros, expressão que acabou sendo encurtada para choro”.
Qual a estrutura do choro?
O choro tradicional é escrito em compasso 2/4 e tem três partes de 16 compassos cada parte (A, B, C), que se repetem em rondó. Inspirada principalmente pela polca, a forma tradicional do choro surgiu como AA BB A CC A, e permaneceu assim até a metade do século 20, quando choros de duas partes começaram a ser aceitos. “Apanhei-te Cavaquinho” (Ernesto Nazareth) e “Tico-Tico no Fubá” (Zequinha de Abreu) são exemplos típicos que retratam a forma de três partes.
Interessante observar que Ernesto Nazareth coloca uma parte de transição antes da parte C em algumas de suas composições, fugindo da regra cima: “Escorregando”, “Nenê”, “Ranzinza” e “Ouro sobre Azul” são exemplos.
Pixinguinha lança seu choro “Carinhoso” com duas partes em 1928 , é criticado e não tem sucesso num primeiro momento. A regra de que “choro deve ter três partes” vigorava fortemente essa época. Carinhoso só alcança o sucesso merecido quando ganha letra em 1937.
“Brasileirinho” de Waldir Azevedo (lançado em 1949) tem um estrondoso sucesso no Brasil e no exterior e definitivamente abre caminho para acabar com o tabu de que choro só é válido se tiver três partes.
Importante ainda observar que muitas gravações antigas não seguem literalmente a forma AA BB A CC A devido à restrição técnica da época com o tempo de gravação (limitado ao redor de 3 minutos), omitindo certas repetições. Especialmente no caso de choros lentos, muitas gravações seguiram a forma A B A C A, ou A BB A no caso de choro de duas partes. Portanto quando você se deparar com uma partitura de choro que não segue a forma tradicional acima, pode ser que tenha sido uma transcrição literal da gravação original. É o caso, na maioria das vezes, para nossas partituras em todos nossos livros.
Fontes
[1] Gomes, Laurentino: “1808” - 2. edição - São Paulo - Editora Planeta do Brasil - 2007;
[2] SIQUEIRA, João Baptista. Três vultos históricos da música brasileira: Mesquita, Callado e Anacleto. Rio de Janeiro: Sociedade Cultural e Artística Uirapuru/ MEC, 1969, pg.98;
[3] Ary Vasconcelos: “Panorama da Música Popular Brasileira na Belle Époque” - Rio de janeiro - Livraria Sant’Anna - 1977